Leite ou "leite de"...eis a questão!
Foi-me pedido que escrevesse sobre este tema dos leites e com toda a razão. Tal como no Pão, a confusão está instalada no Leite. Se faz mal, se faz bem, qual é melhor, e o que dizer do boom dos “leites vegetais” como os de aveia, amêndoa, soja, arroz.
A desinformação é muita pois, mais uma vez, se confunde a natureza do produto em si com as consequências do processamento industrial por que passa até chegar às prateleiras dos supermercados/lojas e às nossas mesas. Hoje falo apenas do leite de vaca, cujo consumo e indústria são predominantes no mercado actual.
Originado nos mamíferos com o objectivo primordial de alimentar as suas crias e fazê-las crescer, é muito discutida a continuação do seu consumo a partir +/- dos 3 anos de idade pelos humanos. Porque somos o único mamífero que continua a fazê-lo em adulto, mesmo com o facto de a maior parte de nós diminuir muito a capacidade de produzir lactase, a enzima que digere a lactose (açúcar do leite).
Assim, a lactose chega ao intestino grosso praticamente sem ter sido digerida, podendo provocar sintomas desagradáveis conhecidos como “intolerância à lactose”.
Outro componente importante do leite é a sua proteína: a caseína. Que existe no leite de vaca em muito maior quantidade do que no leite materno. O seu efeito pode revelar-se alérgico e/ou inflamatório porque o tipo de caseína do leite das raças de vacas actualmente mais exploradas é diferente do que foi e é de mais difícil digestão. Pelo que pode provocar reacções inflamatórias e imunológicas relevantes.
O leite é altamente degradável devido à sua composição. Se não for bebido de imediato nem for devidamente conservado começa logo a alterar-se física, química e biologicamente.
Assim se originam manteiga, iogurtes, queijos e outros derivados que fazem parte da alimentação desde sempre. Portanto, antigamente o leite era bebido “à saída” da ordenha e/ou fervido antes de ser bebido devido ao elevado teor de microorganismos patogénicos que existem nos animais e nos seus habitats, e que são causadores de várias doenças.
A necessidade de conservar o leite para posteriores utilizações foi o que levou à sua industrialização. No entanto, esta industrialização massiva foi exigindo técnicas, em vários níveis da cadeia de produção, que desvirtuaram o leite como produto em si.
Na nossa filosofia, para além da discussão de se deve ou não ser bebido por adultos, a questão também se prende muito com o facto de que o leite a que temos acesso nos supermercados se tornou numa mistura que inclui vários ingredientes que não estavam no leite de antigamente. Que era mesmo só leite!
Assim, algumas das preocupações que me fazem actualmente não consumir leite industrial são relativas a:
Teor de:
Antibióticos: para combater as infecções que advêm do confinamento do espaço de criação e consequentemente da maior proliferação de microrganismos patogénicos.
Hormonas de crescimento: o Homem tornou a vaca numa fábrica constante de leite. Quando os vitelos nascem, são retirados às mães e as vacas são de novo inseminadas para voltarem a procriar e continuar a produzir de leite, com a ajuda de hormonas.
Origem:
A alimentação da vaca: o que é que a vaca comeu? O que a vaca comeu, em parte nós também vamos beber no seu leite. Ao contrário do que é natural, a base da alimentação de um ruminante criado de forma intensiva, não é pastagem/forragem natural. A vaca de criação intensiva e confinada, come muita ração que é constituída por alguma forragem, mas muito por grãos, soja, milho, cada vez mais geneticamente modificados, e cujas consequências a longo prazo ainda não estão completamente esclarecidas.
A questão do Cálcio: mesmo contendo cálcio, não é a única fonte de cálcio na natureza. E importa perceber que não quer dizer que esse cálcio seja absorvido de forma eficaz uma vez que isso depende de vários outros factores, como por exemplo, o teor de magnésio. Como tal, também não está 100% provado que o cálcio contido no leite tenha uma acção directa sobre o fortalecimento dos ossos, até pelo contrário.
Processamento:
Pasteurização/Esterilização: sendo processos muito importantes para a conservação do leite, no aspecto microbiológico e de segurança alimentar, têm, no entanto, o reverso da medalha, pois retiram ao leite uma grande parte do seu valor nutricional, nomeadamente no que se refere a vitaminas e desnaturação de proteínas.
Alavancado pelo aumento dos movimentos Vegan e Vegetariano, surgiu recentemente espaço para o aparecimento de bebidas supostamente substitutas, utilizando produtos vegetais como a soja, aveia, amêndoa, coco ou arroz.
Estes “leites”, rapidamente se tornaram populares, com várias marcas a investirem na sua produção. No entanto, acontece que a maior parte das opções à venda incorpora vários tipos de ingredientes processados, tais como:
Óleos: girassol e palma. Tanto o girassol como a palma podem ser de produção biológica, mas neste caso o seu óleo é normalmente um produto refinado (que não recomendo).
Açúcares como xarope de agave, maltodextrina e frutose.
Muitos, mas MUITOS, aditivos químicos: espessantes como gomas (gelana, caroba, xantana, guar); estabilizantes; carragenina; reguladores de acidez; aromas; acidificantes; fosfatos vários e carbonato de cálcio.
Os espessantes e os óleos são adicionados exactamente para dar mais consistência e proporcionar uma sensação mais “leitosa” ao beber.
Uma nota em especial para o de soja, que na sua origem (China) era feito artesanal e localmente, mas que hoje tem a agravante de ser feito com base em variedades de soja geneticamente modificadas, mais rentáveis e interessantes para a indústria.
Se quer beber estas bebidas, faça-as em casa, juntando o produto ou mistura base com água e usando uma misturadora.
Se ainda assim quiser comprar as opções disponíveis no mercado, então sugiro que verifique SEMPRE bem os rótulos: um leite vegetal deverá ser apenas constituído pelo vegetal que lhe dá nome, por água e eventualmente por sal (de preferência marinho) e algum outro componente não processado e que não seja aditivo químico.
Não é fácil, o mercado está cheio deste tipo de bebidas que, no nosso conceito de alimentação, são tão ou mais prejudiciais que o leite, se contiverem a referida longa lista de ingredientes químicos.
Infelizmente, mesmo nas marcas ditas Bio, podemos encontrar muitos aditivos. Isso porque essa chancela diz respeito só e apenas ao modo como os ingredientes assinalados foram produzidos e não ao modo de fabrico do produto final.
Como conclusão, entre Leite e “leite de…”, a Food Reset recomenda:
Leite ?
SIM: se o consumidor não for intolerante à lactose nem alérgico à caseína, MAS desde que seja (ou eventualmente de ovelha e cabra – especialmente nos derivados de leite).
NÃO: se for intolerante à lactose e/ou alérgico à caseína, e SE for leite industrial de qualquer tipo (refiro-me às marcas normalmente à venda nos supermercados).
“leite de…” ?
SIM: se produto não contiver açúcares nem óleos refinados nem aditivos químicos, ou for feito em casa.
NÃO: se produto contiver açúcares, óleos refinados e vários aditivos químicos.
Até breve!
www.foodreset.net